segunda-feira, 17 de setembro de 2012

PRECATÓRIO HABITACIONAL


Evandro de Pádua Abreu [1]

Frei Gilvander entrevista Evandro de Pádua no Palavra Ética.
Virou moda no Brasil, inclusive em Belo Horizonte, a repetitiva e cansativa alegação dos administradores públicos, no sentido de que a solução de moradia para os carentes, deve seguir a ordem do “Cadastro Habitacional”, criado por aqueles que, além de ignorar o direito constitucional de habitação, não têm a necessária competência para dar fim ao sofrimento dos que não dispõem de meios para ter uma moradia digna, mesmo que modesta.

Em São José dos Campos a desastrosa desocupação do Pinheirinho foi atribuída pelo Prefeito ao “famigerado” Cadastro Habitacional, que se tornou naquela cidade instrumento de proteção de um conhecido e contumaz sonegador de impostos.

Em Belo Horizonte a situação assumiu proporções igualmente graves, quando a Prefeitura obteve ordem da Justiça, através de “despacho singular”, para promover o despejo em área que sequer lhe pertence (Ocupação Eliana Silva, no Barreiro) e quando a imprensa local publicou  uma série de reportagens, dando notícia da venda de terrenos pertencentes ao Município, que bem poderiam ou poderão ser instrumento de solução de parte  do estático Cadastro Habitacional.

Essa providência de desfazer desses terrenos inservíveis é válida, inteiramente válida, porém, não para engordar o tesouro do município, embora com a prometida destinação de sessenta por cento da arrecadação para habitação popular e dos outros quarenta por certo para programas sociais não especificados.

Se esses terrenos não se ajustam às posturas construtivas para fazer o Cadastro andar, deveriam, em primeiro lugar, ser oferecidos em “permuta”, por terrenos próprios para  solucionar o problema dos carentes e, somente em alternativa final, deveriam ser vendidos, porém, para arrecadação de dinheiro “carimbado”, fiscalizado e  destinado exclusivamente às parcerias com a União e o Estado, com a finalidade de viabilizar  projetos que sejam eficazes  e não enganosos, em demonstração, que nunca foi dada, de que o  Cadastro Habitacional não é  apenas um meio de panfletagem eleitoral.

Dessas vendas que estão por acontecer em Belo Horizonte, o que mais se lamenta é a passividade da Câmara Municipal que, de forma efetiva, nunca se preocupou com a falta de abrigo para os carentes, ao que parece, nem quando o Ministério Público e um Vereador mais atento tornaram pública a sua dúvida quanto aos preços propostos para venda,  tudo como também foi  noticiado nas  recentes e oportunas reportagens.

A exemplo do Poder Executivo, os Vereadores, com raras e justas exceções, preferem que, em Belo Horizonte, ao invés, por exemplo,  do “Minha Casa Minha Vida”, multipliquem-se os “Hotéis Viaduto”, as “Pousadas Marquise” e os “Restaurantes Lixão”. Essa é uma solução mais barata e cômoda, pelo menos no pensamento daqueles que não têm compromisso com a miséria alheia e que se escudam em soluções decorrentes de parcerias e remanejamentos obrigatórios para solução de problemas viários inadiáveis, como é o caso da Vila São José, para esconder corajosamente o seu descaso com o sofrimento dos que, ao relento, têm a chuva e o frio como parceiros de todos os dias e das noites que, para eles, são sempre mais longas.

Dentro desse contexto, a conclusão a que se deve chegar é que, pelo menos em Belo Horizonte, o “Cadastro Habitacional” transformou-se hoje em verdadeiro “Precatório Habitacional”, onde são listados aqueles que têm a titularidade de  créditos,  líquidos e certos, mas que não têm o direito de receber o que lhes é devido,  por estarem seus nomes mumificados na inerte contabilidade financeira do tesouro público.

Essa é hoje a situação em Belo Horizonte dos credores de moradia, de baixa ou nenhuma renda, face à sua condição de inscritos e dependentes do estático e enganoso “Precatório Habitacional” do Município.

[1] Advogado em Belo Horizonte, MG, Brasil; ex-secretário da Fazenda do Governo Hélio Garcia (1º mandato) e ex-secretário da Casa Civil do Governo Hélio Garcia (2º mandato) do Estado de Minas Gerais; e-mail: evanpadua@gmail.com

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